sexta-feira, 18 de novembro de 2011

Despedida

Era apenas uma manhã de segunda feira comum, mas ele não estava animado o suficiente pra reclamar da segunda ou da semana (de trabalho) que estava para se iniciar. Não tinha ido estudar e com isso ganhara a manhã livre, coisa que ele gostava demais. Sem mesmo abrir a janela para ver o sol ele se muniu de um café e foi ligar a TV para ver os desastres no noticiário. Após o jornal matinal, nada mais natural que ir para o computador, checar e-mails e coisas banais, dar um oi para os amigos da web e logo buscar por algo pra ler e uma boa música.

A vida era simples nas segundas em casa, nada de barulhos extremos, nada de telefone tocando, apenas a música nacional rolando baixo, no ritmo envolvente, os ponteiros do relógio corriam sem pressa e ele apenas sorria aquele sorriso bobo de felicidade de verdade. Pensava em como toda a situação a sua volta mudara bruscamente, em questão de dias, opiniões e impressões caíram sem nem dar tempo de se preparar. Cansado de tudo, ou quase tudo resolveu que iria sumir – era sempre nas segundas que ele planejava isso – e dessa vez começou a trabalhar em uma carta de despedida.

Aos amigos que tive, e inimigos que criei por qualquer motivo deixo meu sincero agradecimento”.

Decidi sumir da vida de todos, talvez ninguém se importe, talvez umas duas pessoas, não estarei aqui para saber. Mas aos amigos que tive, aos verdadeiros que me acompanharam durante todo esse tempo peço desculpas pelo meu ato de covardia, ainda que em tempo tardio deixo bem claro que amei e me dediquei a cada um de vocês. Talvez alguns se perguntem por que decidi me acovardar dessa forma e partir, mesmo que sem rumo, nesse momento é que digo os motivos, talvez banais ou estúpidos, mas muito real pra mim. Cansei da vida que levava, a rotina me matava cada dia, perdia as alegrias e cansei de tanta desgraça.

Eu vi um velho na rua, ele mendigava por comida, não tinha nem brilho no olhar, andava cabisbaixo e eu nada pude fazer. Eu vi pessoas olhando para ele com ar de superioridade, envoltos em sua estupidez não se lixavam para quem estava ao lado deles. E eu, mesmo com todo o conhecimento que obtive ao longo dos anos, mesmo com toda a instrução adquirida em horas de estudo nada pude fazer por ele a não ser dar um sanduiche. Uma vida de amargura e eu só pude oferecer a porra de um sanduíche pra ele, não pude lhe dar esperança, não pude lhe dar nada mais duradouro do que um prazer gastronômico momentâneo.

Desde então comecei a me questionar por que tento estudar sobre as coisas, se não posso mudar a minha realidade. Por que estudo a língua materna se não consigo me comunicar com quem está a minha volta? Por que estudo sobre a história se não aprendo nunca com os erros do passado? Nada é muito diferente, dia após dia não mudamos nada, e amamos só para ter alguém em quem nos apoiar, mas nem sempre servimos de apoio.

Aos que tinham esperança em mim peço desculpas, não consegui corresponder nem a mim mesmo, por isso certamente decepcionei vocês. Não quero conviver com isso, com uma merda de mundo assim, onde ninguém anima mudar. Eu até pensei em mudar, pensei em todas as frases de incentivo para começar grandes mudanças, mas percebi que até as palavras se mostravam obsoletas mediante tanta mediocridade.

Por isso parti amigos, talvez com um ideal utópico de que ainda existe algo bom em qualquer lugar. Mas precisava disso, precisava de uma dose de esperança do desconhecido, precisava acreditar em algo bom no futuro. A cada um que fez parte da minha história nesse período deixo um sincero abraço, é com lágrima nos olhos que abandono de forma covarde cada um de vocês.
                                        De quem já foi e talvez nunca volte,
Eduardo.

Após escrever a carta ele releu, letra por letra e muitos flashbacks na sua mente. Era preciso coragem, era preciso mais que impulso. Colocou em sua mochila o livro de Miguel de Cervantes - Dom Quixote - e um caderno em branco com uma caneta. Talvez não durasse uma semana no mundo lá fora, mas ele decidira pagar pra ver. O sol estava nascendo quando ele largou a carta na mesa da república na qual morava, pegou o primeiro trem pra cidade do interior e se foi. Somente o sol foi testemunha da lágrima que ele deixou ao partir da cidade.

Um comentário:

  1. lindooo. As vezes só precisamos de coragem pra levantar do comodismo e ir atrás da felicidade.bjooo

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